sábado, 8 de dezembro de 2012

Humanamente falando

Viver intensamente talvez seja o maior clichê que já tenha ouvido. Viver intensamente, penso EU, está além do que defende o positivismo, o carpe diem ou qualquer outra teoria social. Vivemos intensamente quando pensamos ou não na intensidade do que estamos fazendo. Depois de dez meses dedicando nossas vidas, a residência, muito além dos corredores do Hospital São Paulo é inquestionável todo o aprendizado e peso que passamos a carregar. E a sabedoria e força advindas desse processo nos permite entender que não estamos isentos dos erros e tolices inerentes aos sentimentos de vaidade e egoísmo que inexoravelmente fazem parte de nós. Talvez o mais acertado a se dizer é que vivemos intensamente contracenando personagens e projeções de um EU que gostaríamos de ser, e isso em detrimento, das nossas fragilidades.
O super herói é uma projeção recorrente no profissional de saúde [relato de vivência]. Pensar o porque pode nos levar a várias explicações, a mais oportuna, é que o nosso conhecimento e habilidade em estabelecer relacionamentos interpessoais cabíveis ao cuidar nos traz a sensação de bem feitores, e isso em detrimento, da realidade que a salvação é um conceito relativo [salvamos quem? de quem?]. Não que isso anule os méritos da ação, mas se precisamos estar adaptados para melhor convívio como disse o Charles, talvez devêssemos assumir qual o verdadeiro objetivo das nossas ações.
Viver intensamente significa dedicar-se em fazer algo ou em fazer nada. Portanto, ser irresponsável, inconsequente e preguiçoso é tão intenso e elegível a vida quanto a disposição e o compromisso. Assim a ideia de que precisamos de mais momentos felizes do que do sofrimento, cansaço e decepção se consolidam como ideias frágeis. E os rótulos que acabamos internalizando como forma de expressão, nada mais são, do que os figurinos destes atores da vida. Logo aqui vale a reflexão de como um ser mais adaptado lida com a alegria, irresponsabilidade, disposição e sofrimento a seu favor.
De forma oportuna, para nos proteger das nossas faltas, muitas vezes passamos a culpar o sistema, a mudanças inalcançadas, o colega mal humorado, o paciente não colaborativo, por nossas frustrações ... saber viver esses sentimentos são importantes, mas viver deles limita as oportunidades de passar por outras experiências de adaptação.
Acordei hoje com alguns gritos na garganta, arrependimentos e um pouco de auto resignação, pensando em dizer algo diferente e compartilhar ideias que acabaram se perdendo no texto. Só acho que o que o Nietzsche quis dizer com "O homem é um conceito e algo que deve ser superado..."  faz todo sentido, precisamos nos cobrar menos e tirar do dia a dia “o prazer e a dor de ser o que somos”, e isso sem rótulos, humanamente falando.

Sinto falta de outras pessoas compartilhando suas ânsias aqui no blog. Bom final de semana#


Danilo Ponciano 

domingo, 2 de setembro de 2012

Dimensões do CUIDADO

O espelho de Venus, segundo Velasquez




Falar em CUIDADO é tão complexo quanto tentar entender o significado da nossa existência... Apesar das crenças, ideologias e teorias sempre paira a dúvida que se esmera na subjetividade do ser. E na RESIDÊNCIA, estamos imersos a uma busca incansável pelo conhecimento técnico e humanístico das nossas práticas, muitas vezes, creditando a modelos e procedimentos ser a chave para um atendimento eficaz e “correto”. No entanto, não podemos esquecer que o CUIDADO humano, possui dimensões imensuráveis e indescritíveis e que como um “neurônio espelho” convoca efeitos bilaterais [efeito em quem é cuidado e no cuidador].
É indiscutível o quanto aprendemos diariamente com os pacientes, com nossa equipe e com nós mesmos [nos surpreendendo com talentos e atitudes, até então, obscuros]. Ainda sim, vivemos nos negando o direito de chorar, falhar, prostrar, em suma, o de VIVER intensamente. Penso que é preciso olhar pra dentro de si e ir de encontro a um dos EU´s ou mesmo todos os possíveis, tentando entender como assumir o equilíbrio e conforto necessário, para que passemos se não ilesos, ao menos, capazes de tudo o que o dia a dia nos proporciona.
Me “nego” a discutir a introspecção. Contudo, é inevitável pensar em quem estamos cuidando quando cuidando. Se de nós mesmos ou do nosso próximo (?) e claro, se isto está sendo feito da melhor maneira possível (?). A resposta não muda a decisão de cuidar, tampouco, tira seus méritos. Talvez a questão cabível seja como “fazer o bem, sem olhar a quem”?
Muitas destas respostas não estão ‘descritas’ no olhar de quem cuidamos?


" Encontro de dois./ Olho no olho. / Cara a cara. / E quando estiveres perto 
eu arrancarei / os seus olhos
 /
e os colocarei no lugar dos meus.
E tu arrancara
 /
os meus olhos / e os colocara no lugar dos teus.
Então, eu te olharei com teus olhos
 

e tu me olharas com os meus."





Danilo Ponciano
Residente - Farmacêutico Clínico
Programa: Transplante e Captação de Òrgãos 


quinta-feira, 23 de agosto de 2012

No caminho das pedras...




 
Quando agente nasce, nasce também um inconsciente cheio de vontade e força, que sem o nosso consentimento norteia nossa postura e decisões. Um belo dia, chegamos na vida adulta e nos apoderamos da falsa sensação de equilíbrio, sensatez e de um convencimento inoportuno e fatal. Com isso, inadvertidamente somos subjulgados a um maniqueísmo que leva-nos a julgamentos constantes em detrimento do aprendizado, do conhecer, do vivenciar. Em 2005, com a lei 11.129 institui-se o ProJovem, programa do governo federal destinado a qualificação de jovens profissionais  voltado a estimular a inserção produtiva cidadã e o desenvolvimento de ações comunitárias com práticas de solidariedade, exercício da cidadania e intervenção na realidade local.” Na sequência, novas legislações foram aprovadas, no sentido de normatizar e garantir, aos profissionais da saúde contemplados, um  curso de especialização caracterizado por ensino em serviço, sob a orientação de profissionais de elevada qualificação ética e profissional”. Após sete anos de vigência, o que observamos é uma adaptação do beabÁ legislatório ao falatório organizacional das empresas executoras e parceiras, culminando com uma atrofia do desenvolvimento humano e técnico-científico dos estudantes.  
Opiniões divergentes e interesses distintos não são empecilhos ao grupo com um ou mais objetivos concordantes. Exceto, aquele que não possui definições claras de suas metas e que não consegue se eximir da subjetividade carregada de julgamentos. A destarte, este é um momento que nos insita preocupações e coloca o Multiprofissionalismo em risco, uma política que não só busca a humanização dos atendimentos em saúde, contemplando as diversas demandas que um indivíduo possa ter, de forma integrada, racionalizada e eficaz, bem como, tende a trazer maior valorização as categorias profissionais envolvidas. Convocando-nos a importância de assumir de forma individual e coletiva a responsabilidade na defesa deste movimento.
A muito creditou-se às academias o poder centralizador na construção do conhecimento e na geração de políticas sociais que nortearia nossa civilização. Apesar das controvérsias, é sim este um meio rico para o desenvolvimento humano e consequentemente oportuno às melhorias. No entanto, é também um ambiente onde se observa excessos na burocratização das ações, o engessamento do conhecimento prosaico e desprovido de juízos de valor e a atrofia de iniciativas comprometidas com a sociedade. A saber, cito a resistência em aceitar o novo buscando adapta-lo ao velho.
A estranheza em questão não focaliza as intempéries no caminho das pedras, pois estes são aceitáveis e esperados. O que está em discussão é a perda de foco, de valores e a entrega imatura do “maduro” ao seu famigerado inconsciente. Inconsciente que nos trai, nos torna prisioneiros da falsa sensação de poder e que fatalmente atinge aqueles que por infelicidades do acaso cruzaram nossos caminhos. 




Aos colegas Residentes, digo que “aquilo que vem do coração”  reage em cadeia / Incendeia o corpo inteiro / Faísca, risca, trisca, arrodeia / Dispara o rito certeiro / É Avassalador / (...) / Toma de assalto, atropela / É uma Vela de incendiar / (...) / É aquilo que ilumina / Invade a retina / Retém no olhar / É
O lance que laça na hora(...) Que O mundo muda !
 

Danilo Ponciano
Residente – Farmacêutico Bioquímico
Programa: Transplante e Captação de Órgãos